A preposição “trás” não significa “atrás” nem “traz”
Diferentemente de outras preposições mais produtivas (de, em, para, por…), o vocábulo “trás” não costuma atuar de forma isolada na sintaxe atual. Seu funcionamento permanece essencialmente restrito a algumas estruturas fixas, o que faz com que muitos falantes o confundam com “traz” ou “atrás”. Essa confusão é um fenômeno muito frequente no português brasileiro, principalmente devido à semântica do advérbio de lugar ou à ortografia do verbo trazer.
Em sua origem, “trás” deriva do latim trans, que possuía significado ligado à ideia de “além de”, “para lá de”. Com a evolução da língua, essa palavra sofreu transformações fonéticas e semânticas até se estabilizar como um advérbio e locuções adverbiais.
De acordo com o dicionário Houaiss, o significado de “trás” é:
posterioridade no espaço ou no tempo para depois de um ponto de referência.
Com isso, a preposição teria o mesmo sentido de “após” ou “atrás de”, estando em desuso no português atual, embora esse sentido ainda resista na composição de algumas palavras historicamente marcadas, como “Trás-os-Montes” e “trasanteontem”.
Contudo, o que prevalece são as formas locucionais de sentido similar ao adverbio atrás. Veja algumas.
Locuções adverbiais – “de trás”, “para trás”, “por trás”.
Exemplo: “eu viajei no vagão de trás”.
Locuções prepositivas – “de trás de”, “por trás de”.
Exemplos: “O gato saiu de trás da coluna”; “Por trás de um grande homem, sempre existe uma grande mulher”.
A confusão entre “trás” e “traz” refere-se apenas à ortografia, pois não há o que se confundir na semântica: “traz” é flexão do verbo “trazer”, que indica o transportar de alguma coisa, como em “ele traz o livro consigo”. Essa confusão surge porque, na fala, ambos os vocábulos são homófonos para grande parte dos brasileiros. Em termos práticos, uma estratégia simples consiste em tentar substituir a palavra por “leva”; se a frase continuar coerente, trata-se de “traz”; caso contrário, trata-se de “trás”.
Assim, a preposição “trás”, embora discreta no cotidiano, continua desempenhando papel relevante na língua portuguesa atual, servindo como testemunho vivo da história e das nuances do nosso idioma.
Prof. Daniel Costa Júnior

Referências de base
BECHARA, Evanildo. Moderna Gramática Portuguesa: 38 ed. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2015.
HOUAISS, Antônio; VILLAR, Mauro de Salles; MELLO FRANCO, Francisco Manoel de. Dicionário Houaiss da língua portuguesa. Rio de Janeiro: Objetiva, 2009.
PESTANA, Gilda. A classe gramatical e o uso de trás. In: Ciberdúvidas da Língua Portuguesa. Lisboa: Instituto Universitário de Lisboa, 2023.


